Travessia nos Lençóis Maranhenses: Terceiro Dia de Queimada dos Britos à Lagoa do Junco
A travessia nos Lençóis Maranhenses é daquelas experiências que marcam para sempre. Uma combinação de esforço físico e momentos de pura contemplação, quando tudo o que existe é você, o vento e o cenário ao redor. Depois de dois dias intensos, de Atins até Baixa Grande e, em seguida, de Baixa Grande até Queimada dos Britos, chega o tão esperado terceiro dia. É quando o corpo já sente o peso da jornada, mas a expectativa pela recompensa final é ainda maior. Esse é o dia marcado pela partida antes do amanhecer, pelo nascer do sol arrebatador e pela chegada à imponente Lagoa do Junco — um dos lugares mais emblemáticos de todo o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses.
Antes de entrar nos detalhes dessa etapa, vale lembrar um pouco sobre esse cenário único. O Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses foi criado em 1981 e, em 2024, recebeu o título de Patrimônio Mundial da UNESCO, reconhecimento mais do que merecido por sua beleza e formação geológica singular. São cerca de 1.500 quilômetros quadrados de dunas brancas que se estendem por 70 quilômetros ao longo da costa, recortadas por lagoas cristalinas formadas pela água da chuva. É um contraste tão surreal que justifica cada clique de câmera — e, mais ainda, cada passo da caminhada.
No terceiro dia, esses elementos se apresentam de forma ainda mais intensa: são entre 12 e 14 quilômetros, a maior distância percorrida até então. Mas o que torna essa etapa memorável não é apenas a quilometragem, e sim a harmonia entre o esforço e as descobertas sensoriais.
Acordando Cedo e o Café da Manhã Revigorante
O terceiro dia da travessia nos Lençóis Maranhenses começa antes do amanhecer, com o despertador tocando às 3h30. Apesar de parecer cedo demais, é a melhor forma de evitar o calor intenso que toma conta das dunas após as 9h. Na casa do Lelé, em Queimada dos Britos, o ar fresco e o silêncio criam um clima de expectativa, enquanto o corpo se prepara para a jornada.
Antes de colocar o pé na areia, a Fernanda — que trabalha com o Lelé — já nos esperava com um café da manhã de respeito: ovos mexidos no ponto, tapioca fresquinha, pão quentinho, suco de frutas tropicais, bolachas crocantes e um café forte e aromático que acordava até pensamento. Simples, mas perfeito para repor as energias. Era mais que comida; era como um abraço maranhense antes de encarar o dia.

Enquanto comíamos, o guia aproveitava para passar as últimas dicas: levar bastante água, reforçar o protetor solar, cuidar do ritmo. A mesa servia também de “sala de ajustes”: conferimos mochilas, arrumamos lanternas e garantimos que nada ficasse para trás. Com o estômago cheio e a disposição renovada, partimos no escuro, iluminados só pelo brilho das estrelas e pela vontade de viver mais um dia incrível de travessia.
A Partida no Escuro e a Magia da Caminhada Noturna
Saímos de Queimada dos Britos por volta das 4h30, com a noite ainda bem fechada. O silêncio era quase absoluto, quebrado apenas pelo som ritmado dos passos na areia e pela brisa leve. O céu, completamente limpo, estava tomado por estrelas, e o nosso guia Miquéias comentou que, em noites como aquela, a Via Láctea aparece com nitidez impressionante. Foi impossível não parar por alguns segundos para olhar — é o tipo de visão que realmente faz valer a saída tão cedo. Dica extra: caminhe um pouco com a lanterna apagada para ver melhor a luz das estrelas.
Caminhar no escuro exigia atenção. As lanternas de cabeça ajudavam a iluminar o caminho e a evitar tropeços nas dunas irregulares. O clima fresco deixava a caminhada mais leve, e assim a gente conseguiu manter um ritmo constante sem pressa. Depois de cerca de uma hora, fizemos uma pausa rápida para beber água e descansar um pouco antes de seguir.
Essa primeira parte do dia tinha um clima diferente. A ausência do sol e a temperatura agradável ajudavam a avançar com mais tranquilidade, e o ambiente mais silencioso funcionava como um aquecimento natural para o que viria a seguir: a transformação total da paisagem com a chegada do amanhecer.
O Espetáculo do Nascer do Sol nas Dunas
Paramos no alto de uma duna para ver o nascer do sol, um dos pontos mais marcantes da travessia nos Lençóis Maranhenses. As cores apareceram aos poucos no horizonte, refletindo nas lagoas e revelando a dimensão do parque. Encontramos outros grupos pelo caminho, cada um no seu ritmo, mas todos parando para aproveitar a vista. O guia comentou que o cenário muda conforme a época do ano, mas o espetáculo dura sempre poucos minutos e transforma completamente a paisagem.

O ar fresco ajudava a aproveitar o momento e a registrar boas fotos antes de seguir viagem. A pausa serviu também para recuperar o fôlego. Foi um lembrete claro do porquê vale a pena começar tão cedo: evitar o calor e ainda ganhar um visual desses como recompensa.


As Lagoas ao Longo do Caminho e os Encontros Sociais
Logo depois do amanhecer, passamos por uma primeira lagoa, mas seguimos sem entrar por causa do clima ainda fresco. Estava bem friozinho ainda! Já na segunda, com o sol mais forte, não resistimos a um mergulho. A água, apesar de gelada, ajudou a aliviar o calor e serviu como pausa para descansar antes de seguir.

E uma das coisas mais bacanas da travessia é que é comum reencontrar os mesmos grupos em diferentes pontos do trajeto, e ali não foi diferente. Reencontramos o pessoal que estava no mesmo abrigo que a gente no primeiro dia, e isso foi incrível! Colocamos a conversa em dia e dicamos cerca de 30 minutos aproveitando antes de retomar a trilha.

Chegada à Lagoa do Junco: O Clímax da Jornada
Por volta das 9h, chegamos à Lagoa do Junco, uma das maiores e mais conhecidas do parque. A água azul profunda contrastava com as dunas brancas ao redor e, segundo o guia, ela é uma das lagos que nunca seca. Também é o ponto onde os grupos que encerram a travessia nos Lençóis Maranhenses costumam se reunir, já que dali partem os veículos 4×4 das agências para buscar os caminhantes. Depois de três dias e cerca de 12 a 14 km percorridos naquele dia, ver esse “oásis” foi como cruzar a linha de chegada.

Aproveitamos para descansar e curtir o lugar por quase uma hora. Nadamos, sentamos na areia e deixamos o corpo relaxar depois de dias de esforço. É comum reencontrar grupos que cruzamos ao longo da travessia, e o clima ali é sempre de comemoração, com risadas, fotos e aquela conversa rápida antes de cada um seguir seu rumo. Alguns ainda estendem a caminhada até Santo Amaro, mas para nós, ali era o ponto final.

Às 10h30, o Chacal chegou com a caminhonete, marcando oficialmente o fim da jornada. A sensação era de cansaço, mas também de satisfação por tudo o que vimos e vivemos — e a imagem da Lagoa do Junco, com sua água azul no meio do branco das dunas, ficou guardada como o encerramento perfeito dessa experiência.
Dicas Práticas para o Terceiro Dia
Para maximizar sua experiência no terceiro dia da travessia nos Lençóis Maranhenses, aqui vão algumas dicas essenciais:
- Hidrate-se constantemente: Leve pelo menos 2 litros de água, pois o trecho é o mais longo e o sol pode ser implacável após as 9h.
- Proteja-se do sol: Use chapéu, óculos e protetor solar de fator alto; reaplique após os mergulhos nas lagoas.
- Ajuste o ritmo: Comece devagar no escuro para evitar lesões, e use pausas para fotos e descanso.
- Observe a fauna: Mantenha distância de animais preservando o habitat.
Conclusão: Reflexões Finais Sobre a Travessia

Fechar a travessia nos Lençóis Maranhenses no terceiro dia é uma mistura de exaustão e felicidade. As pernas reclamam, o corpo pede descanso, mas a cabeça está cheia de imagens que vão ficar para sempre. Mais do que a quilometragem, o que realmente marca é aprender a lidar com a natureza imprevisível — as dunas que mudam de forma, as lagoas que aparecem e desaparecem — e entender como tudo ali é passageiro e, por isso mesmo, precioso.
Olhando para trás, percebo como essa experiência não teria sido a mesma sem o esforço de todo mundo envolvido: os guias que conhecem cada canto, as comunidades que nos recebem pelo caminho e os companheiros de trilha que compartilham tanto o cansaço quanto as conquistas. Terminamos cansados, mas com aquela sensação boa de missão cumprida. Se fosse dar um conselho, diria: faça a travessia, mas faça com respeito. É um privilégio caminhar nesse patrimônio da UNESCO, e cada passo precisa ajudar a manter o espetáculo vivo para quem vier depois.
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